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O desbravador da matemática que domou o “bicho-papão” na Amazônia

Destemido e pioneiro. Tanto o adjetivo quanto o substantivo que se somam às demais referências cantadas no Hino do Estado de Rondônia para enaltecer o povo desbravador, que civilizou o então território que alçou à condição de Estado em 1982, cabem milimetricamente na biografia do professor Amarildo Ferreira, 59. Embora tenha lecionado outras disciplinas, foi na matemática que multiplicou casos de sucesso durante as décadas de docência.

O educador é destemido no desafiante universo dos números porque teve coragem de cursar faculdade nessa área depois de adulto. Criou métodos e armas para afugentar os medos do “bicho-papão” como é tratada a matéria que, desde os primórdios da humanidade, tem papel preponderante no desenvolvimento humano. Agora, é um alicerce para os pilares da inteligência artificial, um largo passo rumo ao futuro da existência humana.

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Sobre o pioneirismo, ele mesmo faz questão de recordar como tudo começou na profissão que jamais imaginou abraçar. Foi na década de 80, quando deixou a cidade de Campo Mourão no Paraná com destino ao Eldorado da época que era a região Norte.

Depois de Jaru, a primeira cidade a lhe acolher, mudou-se para Itapuã do Oeste, onde trabalhou em posto de combustível e madeireira. “Devido à experiência no comércio, alunos da vizinhança começaram a me procurar para tirar dúvidas sobre matemática”, relembra sua chegada na localidade que na época era distrito de Porto Velho e foi emancipado em 1992.

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Por causa da grande procura das crianças e adolescentes, improvisou uma sala de aula na varanda de casa, onde foi fixado um quadro negro. Cada aluno levava o seu giz, utilizado justamente para ensinar as operações que queriam aprender a resolver.

Muitos alunos dessas turmas, segundo ele, venceram na vida; inclusive, alguns hoje são professores, médicos, advogados, engenheiros, entre outras profissões.Muitos alunos dessas turmas, segundo ele, venceram na vida; inclusive, alguns hoje são professores, médicos, advogados, engenheiros, entre outras profissões.

A fama do professor voluntário ganhou as ruas da cidade até chegar aos corredores da Escola Paulo Freire, cuja diretora foi até a casa dele para lhe fazer um convite para lecionar no estabelecimento de ensino, diante da carência na região de professores dessa área.

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Recebeu então a proposta de ser contratado para ministrar vinte horas de aulas e lecionar apenas à noite, o que lhe permitia continuar no emprego. Aceitou a missão. Destacou-se. Teve o contrato alterado para quarenta horas. Em seis meses, desligou-se da empresa onde trabalhava e se dedicou exclusivamente ao setor educacional.

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“Percebi que a educação estava na minha essência”, recorda Amarildo, que atribui seu desempenho na arte de educar à pedagoga Thereza Silvestre Leandro, 83. Na condição de supervisora do colégio, ela lhe deu preciosas dicas e orientação pedagógica. “Naquela época, os professores eram leigos. A única pedagoga formada era eu porque vim do Paraná. Tinha me aposentado e passei num concurso público em Rondônia, onde cheguei em 1986”, recorda.

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Era uma época em que estavam em evidência projetos pedagógicos, o que deu liberdade ao jovem professor para trabalhar com a matemática lúdica. Mais tarde, ele formou-se em Licenciatura Plena em Matemática pela Universidade Federal de Rondônia.

Sua meta era desmistificar a disciplina. Para tornar o ensino da matéria mais atrativo, apostou em diversos recursos, mas sempre norteado pela contextualização, ou seja, explicar cada conteúdo com base na realidade da turma.

Com esse propósito, gravava programas de TV e levava para sala de aula. A novidade era uma atração porque, na época, só assistia televisão quem possuía antena em casa. “A escola tinha o aparelho de televisão e eu levava o videocassete”, conta o educador que utilizou a tecnologia em sala de aula antes mesmo do programa TV Escola, lançado em 1996.

Embora se orgulhe pela inovação tecnológica, enumera entusiasmado algumas dinâmicas que adotava para humanizar o aprendizado. Seus métodos pedagógicos reuniam objetos do dia a dia como tabuleiro de xadrez, dominó, baralho e o brinquedo jogo imobiliário, pelo qual ensinava a turma a ter educação financeira por meio de gráficos, tabelas, entre outras linguagens voltadas à estatística.

Tabuada manualTabuada manual

Tal dinamismo era extensivo ao dever de casa, pois os estudantes recebiam sempre um desafio. “Eu queria inovar e os alunos gostavam. Sempre tinha alguém que perguntava qual seria a charada da próxima aula”, relembra ele. Todavia, não partiam apenas do professor ideias inovadoras para aprender matemática. Certo dia, ele observou, numa escola rural, um aluno de 9 anos que, na hora de fazer exercícios de operação, espalmava as mãos encostando uma na outra.

Fazia de conta que cada dedo representava uma dezena. Fazia um movimento circular lentamente como uma catraca para resolver operações matemáticas. Questionado sobre como descobriu o macete, o estudante disse que a avó ensinou para sua mãe, que lhe repassou a dica da tabuada manual.

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Com a experiência em Itapuã do Oeste, onde chegou a ser secretário de Educação, Amarildo foi aprovado num concurso público municipal em Jaru. Passada uma década na cidade que foi seu primeiro destino quando chegou em Rondônia, mudou-se para a capital Porto Velho, onde continuou lecionando até ser convidado pela Secretaria de Estado de Educação – Seduc para uma nova missão. Foi atuar na equipe de Formação Continuada de Matemática para professores da rede estadual de ensino. Ministrou cursos para docentes de todo o Estado de Rondônia, inclusive professores indígenas.

Graças à larga experiência, foi o único professor do cenário rondoniense a figurar na lista de onze especialistas em matemática do Brasil na ficha técnica da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), documento essencial na padronização do ensino em todo o país, aprovado em 2013.

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Deixando um legado na construção do saber, fez MBA de Controladoria e Auditoria. Recebeu mais um convite da Seduc para atuar no controle interno da pasta, onde ficou por dois anos.

Hoje, desempenha essa mesma função em outro órgão. Trabalha no Idep (Instituto Estadual de Desenvolvimento da Educação Profissional de Rondônia), que oferta ensino profissionalizante gratuito. Entre os cursos oferecidos pela instituição está Técnico em Administração. Foi justamente esse curso que Amarildo fez no início da carreira para trabalhar no setor administrativo. No entanto, apaixonou-se pela educação, desbravou o mundo da matemática e ajudou muita gente a vencer o bicho-papão na Amazônia.

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